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A APOSTA

ALVES, Rubem. O que é religião. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1984

“Curioso, entretanto, que nenhuma das testemunhas [pensadores pesquisados] tenha sido jamais vista nos lugares sagrados, em busca de comunhão com o divino. E o que é mais grave: é sabido que nenhuma delas jamais acreditou naquilo que a religião tem a dizer” (p. 116)

Para a produção desta obra, Rubem Alves se baseou em especialistas de diversas áreas e extraiu deles suas visões sobre a religião. Alguns desses estudiosos viam a religião como algo negativo, que enganava e iludia as pessoas. Outros viam a religião como algo importante e necessário diante da natureza humana. O autor também destaca, conforme citação inicial deste texto, que esses pensadores jamais foram crentes naquilo que as diversas religiões pregavam.

Isso se deve, segundo Alves, à postura do cientista, que deveria observar os fenômenos sem se envolver com eles. Por isso, buscavam compreender a natureza do que os homens falavam sobre a religião, porém, vendo-os como pessoas muito crédulas e ingênuas a ponto de crerem em um mundo mágico de ilusões. A verdade, então, era acessível somente à ciência, cuja tarefa era dar rigorosidade ao senso comum.

"Não lhes sobra outra alternativa. Todas as ciências, sem exceção, são obrigadas a um rigoroso ateísmo metodológico: demônios e deuses não podem ser invocados para explicar coisa alguma. Tudo se passa, no jogo da ciência, como se Deus não existisse." (p. 117)

Neste sentido, entender a religião, para a ciência, é uma parte necessária para compreender o conhecimento humano e o desenvolvimento da humanidade.

Ao tratar da obra, Rubem Alves, destaca seu esforço ao longo dos capítulos, ao tentar aplicar diferentes olhares na análise do que é religião. Além da visão positivista, o autor encarna pensadores como Durkheim, Marx, Freud e Feuerbach, além de tentar explicar o mundo dos profetas.

Mas, neste último capítulo, Alves aponta a necessidade de silenciar por um instante a voz do cientista para que transpareça aqui do que somos feitos: desejos, vontades, sofrimentos, esperanças. É preciso alimentar uma crença nos deuses, mesmo que muitos de nós não acreditemos neles, para entender cientificamente o sagrado.

"Teríamos certezas sobre as coisas que amamos e que vemos, com tristeza, envelhecer, decair, sumir… Ah! Se pudéssemos ficar grávidos de deuses… E é assim que passamos para um outro mundo em que a fala não está subordinada aos olhos, mas ligada ao coração." (p. 118)

Aquele que crê no sagrado possui uma visão real de um outro mundo, diferentemente da visão científica sobre a religião. Daí a necessidade de analisá-la como se acreditasse. É preciso entender a religião como aquela que fala sobre o sentido da vida e justifica a vontade de viver, mantendo o fascínio por ela mesmo em tempos lógicos e modernos como estes em que vivemos. É nesse sentido que Alves afirma que

"A ciência nos coloca num mundo glacial e mecânico, matematicamente preciso e tecnicamente manipulável, mas vazio de significações humanas e indiferente ao nosso amor." (p. 121)

O sentido da vida, fruto da angústia humana, é inexplicável pela ciência. Trata-se de um experimento emocional necessário para a razão de viver ou de morrer por algo que lhe faça sentido. O sentido da vida ocorre natural e inesperadamente, o que o torna impossível de ser planejado, preparado ou construído. Ele está no íntimo de cada ser humano na medida em que

"O sentido da vida é um sentimento." (p. 123)

A religião explora este sentimento transformando-o em hipótese sobre o universo, trazendo uma explicação que faça sentido. Ao entender que o universo vibra com os nossos sentimentos, criamos uma realidade onde tudo está interligado, nos dando explicações para a realização de sacrifícios nos altares e de preces em orações.

Essa ligação com um universo de rosto e coração humanos é usada para justificar a dor e demais sensações, além de guiar nosso senso ético e moral, nos permitindo julgar como absolutamente erradas e inaceitáveis práticas humanas como a tortura, a escravidão, a fome, a devastação ambiental, o abandono, entre outras. Mas, para explicitar que os sentimentos não são absolutos, Rubem Alves questionou:

"Que razões trazemos conosco que nos compelem a dizer não a tais atos? Serão os nossos sentimentos apenas? Mas, se assim for, que poderemos alegar quando também o carrasco, também o torturador, também os que fazem armas e guerras invocarem os seus sentimentos como garantia de suas ações? Também eles sentem… Ainda permanecem humanos." (p. 125)

Logo, irrestrito aos sentimentos, nossos julgamentos éticos são resultados da identificação de nós mesmos com o universo inteiro, ancorado no nome de Deus, que julga e sofre pelas ações humanas.

Contraditória diante do sentido da vida, a morte é outro elemento de ligação do ser humano com a religião. Ao mesmo tempo em que nos dói, a morte simboliza a esperança de uma vida eterna, permitindo-nos reconciliar-se com ela para que possamos viver. O fato de a vida ser finita a torna um universo curto e belo, carregado de destinos e significações.

Outro elemento essencial à experiência religiosa é o futuro. A utopia que nutre nossa imaginação sobre um mundo melhor produz a marca maior da existência da religião: a esperança. Para encerrar essa maravilhosa obra, o autor faz uma aposta entre a esperança produzida pelo mundo religioso e a incerteza de fria lógica do mundo sem religião:

"Mas, e Deus, existe? A vida tem sentido? O universo tem uma face? A morte é minha irmã?’. Ao que a alma religiosa só poderia responder: ‘Não sei. Mas eu desejo ardentemente que assim seja. E me lanço inteira. Porque é mais belo o risco ao lado da esperança que a certeza ao lado de um universo frio e sem sentido." (pp. 128-129)

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